29 julho 2006

Ponto do ponto

...
A gente trabalha o ano inteiro
Por um momento de sonho
pra fazer a fantasia
de rei ou de pirata
ou jardinera
E tudo se acabar na quarta-feira
Tristeza não tem fim
Felicidade sim.

O carnaval seria...
Mas o dia-a-dia é.

Um dia que poderia
Mas não é permitido.

Sombra de sonho
sem liberdade.

Tudo tem ponto
porque é nosso desejo.

Sou louco ao ponto
de querer o descanso.

Não sei onde me leva o conto
porque tudo termina num ponto.

Do ponto tudo é Literatura

24 julho 2006

FOLÁ

Não estou aqui
É lá
e ali
Quem disse que
corpo e fantasia
estão atados
no espaço e no tempo?

Venho Para-ti
no mar no carro
Estou para-mim
sendo
todos os advérbios
menos o meu lugar e o meu tempo.

Para-qui
Para-li
Parado
Na ausência de tudo
do espaço inconsintente
e mais:
diluído.

18 julho 2006

A clínica fica em Rio de Dentro. Aqui os médicos me vêm sempre com esses xaropes coloridos, de hora em hora, para evitar crises nervosas. Me dizem que estou praticamente curado, bastam algumas semanas que as doses dos remédios serão diminuídas, até não precisar de nada. Mal sei como escrevo isso, não entendo nada do que me falam, vivo um tempo ausente. Meu corpo sangra pelos poros como se fosse suor, contraído me causa enxaquecas que turvam meus olhos... Também não sei como tenho noção de minhas reações, meu tempo é nunca. Vejo todos andando sem rumo, de um lado a outro, olhos vidrados nas paredes brancas do refeitório central. Alguns se aproximam de mim, percebo que os lábios se movem, mas tudo que dizem é som sem significado, me tornam mais distante ainda. Aliás, nem sei, creio que me aproximam da realidade, mas meu corpo rejeita tudo, seja o doce, seja o mal. Vivo neste meio sem existir. Vagando torpe me descubro nu, enquanto todos estão de branco, me vejo sentado agarrado aos joelhos, movendo-me como uma cadeira de balanço. Os médicos querem me levar, parece que tive uma recaída, mas não, eu não melhorei, estou no limbo. Se me faz bem, já nem sei, se me faz mal, tenho lá minhas dúvidas, acontece que Miles e Coltrane me contaram suas experiências e eu nem mesmo sorri para eles. Agora me sinto mal, rejeitei meus ícones, como se fossem lixo-jazz. Subo as paredes do refeitório rasgando meus dedos, há marcas de sangue por todo o salão. Ninguém consegue me alcançar. Não vivo o mesmo tempo de todos, vivo um tempo distante, ausente do espaço e do próprio tempo. Longe de mim nada se move, nada é sentido. Só sei que os remédios não estão funcionando. Curioso, porque sinto dor e paz na mesma idade, vago entre o certo e o incerto num flash. Me diluo em minhas fantasias e medos, e os médicos sequer vislumbram esse ritmo. Não quero mais remédios, tenho que sair daqui!

17 julho 2006

Não

Cale-se
Sussure para si
Espere
Fale com os olhos
Não diga
Respire

16 julho 2006

...

Desrealização
Sinto de todo
O tempo é duro
Lento...
Lento...
Lento...
Lento...
...
...
...
...
O tempo criado
é tempo assassino
e de assassinos
Feras
Sangue
Cheiro de podre que exala
Anestésico
Somos passivos
MOrtos
Tenho nojo
Não se pOde mais amar
Assassinos!!!!!
O tempo...
...
...
...
...
...
( )

11 julho 2006

Diálogo Di Dentro

Temo pelo imprevisível. Acho que me refugio no temor para não encarar o óbvio. Se o imprevisível me aflige, o que fazer? Sentar, comer e dormir? Não creio. Não ficarei na “sala de jantar” esperando pela morte. Entretanto, sinto o peso de um fim anunciado, que só minhas entranhas teimam em deixar acontecer. Temo porque tenho medo de ter medo. Por isso sofro ainda mais, uma vez que nem medo consigo ter: eu fujo dele. Mas querer fugir, então, é uma gota de orvalho que ainda resta. Veja, continuo correndo, só eu não percebo. Páre, não é assim: se eu corro sinto minhas pernas dormentes sigo tenho câimbras permaneço a trajetória luto (dói como dói) em frente só o horizonte infinito de minha ambição; sonho (todos ficaram sem ar). No ponto final descubro que há fim, sempre – e para tudo. Sentado no meio fio, recorro a Deus (o que nunca faço, porque pessoa mais incrédula que eu não deve ser de boa índole – ou seja, ninguém). Travo uma disputa pessoal: eu contra mim. Não me venham vocês que estudam língua, assim que quero, e assim eu escrevo. Desejo um dia sem ponto, mas o dia do ponto me parece excitante.