19 dezembro 2008

Na cama do sonho

Vejo o tempo objetivo
mas quando ele se move
tudo se vai subjetivo.

Contar as horas
é uma perda vital.
Se vejo os segundos,
os anos vagam com a respiração e o vento.
E assim existir se torna morrer sem pensar.

Uma boca, este olhar
um sorriso,
choro, dor
um abraço
lembranças
carinho
brutalidade
Morte.

Outra boca...

Limpei os pés, as mãos
cortei as unhas, o cabelo
Deixei o branco,
as rugas, a calvície
e a corcunda;

todas figuras do tempo
implícito.

Deitei na cama do sonho
e morri para as horas,
fiquei sem o tempo
e voltei à infância
estou sem o tempo
para pensar que sonho

Agarrei-me às cordas da carne
e aos braços da memória e do presente.

16 dezembro 2008

Pára (com acento)!

Uma palavra:
O reconhecimento imediato.
Assim se vai
à espera
...
...
...

?
O que foi
O que vai
O que seria
Perguntas

Mas questionar é um modo de ser
para estar perto de quem se quer
sem poder chegar.

Se não pode
há uma explicação:
tudo é pura convenção.

08 dezembro 2008

Eles, embora aqueles.

Um vento frio, mesmo no calor.
Um tempo presente que não voltará.
Tensão, ânsia, desespero.
Uma multidão que gritava calada.
Uma criança que ama inconsciente.
Uma senhora que amou e amaria
mas ele adoeceu...
A adolescente apaixonou-se
embora ele tenha muita idade
e não seja o que esperavam.
O homem que trabalha
e seus filhos vivem desviados
- grande batalha judicial.

A rua está cheia de gente que vive na rua.
Muita gente passa na rua, mas não vive nela.
E nessa rua cheia onde muita gente vive e outras passam
o dia se divide:
Eles e aqueles.
De dia eles vêm e suspiram: trabalham
De noite eles vão e tragam a si mesmos
(amanhã, um recomeço).
De dia, aqueles não vêm
já foram, não tem retorno.
O tempo é um pai agressivo
Decepou-lhes a cabeça, os pés
e imobilizou os braços.
aqueles deixaram
porque simplesmente nasceram.
Eles tentaram
porque adoeceram depois de nascer
e seguem enfermos
alheios inconvenientes inquietos
in... a... des... dis...

21 setembro 2008

Deixe de escrever e verá o que te espera no fim...

Ontem o dia virou tarde
E tarde, virou o dia.
À tarde, não via mais o sol
e era tarde pra ver o mar.
O mar cuspiu sangue
e o sangue virou a tarde.
A luz tocou a noite
e a tarde se foi em sombra.
Na ausência vem a madrugada
templo do silêncio
e da imagem desfigurada.
Cansada, adormece
e no sonho percebe
quando o dia esquece (...)

Agora

Escrevi estes versos
pra dizer que
agora
eu te amo.
Não, não se assuste não,
porque ontem e nos outros dias
não deixei de te amar.
Meu tempo não é mais meu,
é nosso.
Quando me pertencia,
ele passava,
existiam ontens, hojes e amanhãs.
Quando o tempo é nosso,
ele é sempre presente.
Por isso eu digo
que eu te amo agora.

Sobre Machado - palhinhas leves

A invenção do blogger certamente fez Machado gritar como uma criança ao receber um simples presente dos pais. De plena interatividade, fácil acesso, e sem a dependência das editoras, o blogger se transformou na forma-modelo de contato entre os homens através da escrita. Jornais e livros? Que nada, meus caros alunos e amigos professores. Por isso, o comentário do Fabrício, inicialmente apenas um elogio, passou a ser uma contribuição, justamente o sonho machadiano da troca, do intercâmbio, em que texto e leitor se constroem mutuamente.

Assim, pessoal, nesse ano comemorativo, não da morte, mas da plena vida de Machado, independente das provas do vestibular, as discussões sobre o maior autor de língua portuguesa da história precisam ser levadas rio abaixo.

Muitos acreditam na existência de uma verdade, a suprema e perfeita verdade. Machado, por sua vez desarma o absolutismo, e estabelece a relativização dela, a partir do romance Dom Casmurro. Supercifiais são todas as análises que buscam a verdade sobre a traição, porque é justamente na ausência dela (verdade), que se situa o discurso Machadiano, discurso este, confirmado pela máxima Kantiana: "a verdade não está em si, está em mim". O Bruxo não pretendia narrar um adultério, como haviam feito Flaubert e Eça, mas sim trabalhar com a destruição das verdades inexpugnáveis que nos assolam até hoje, responsáveis por guerras e mortes. Se Capitu foi manipuladora, nós só criamos este mito, em função da voz do narrador do romance, Dom Casmurro, que resolve escrever quando velho e solitário. Então, o distanciamento temporal, associado ao ciúme neurótico do narrador, rascunham uma figura feminina perversa e destruidora. Não há uma verdade aparente, mas sim uma verdade pensada, e pensada por um indivíduo fundado nas razões da emoção. Sim, gritem, questionem, mas a razão é esta sim, por mais contraditória que nos pareça. Como diria a nossa Bossa Nova, "o coração tem razões que a própria razão desconhece". A relativização da verdade, que estaria nas mãos de cada indivíduo, é marcada pela emoção, o que constitui severa divergência em relação ao automatismo e presunçoso Realismo, escola que inviabiliza, para construção de qualquer narrativa, a subjetividade como meio, uma vez que o escritor seria o "cientista da palavra".

Machado, sempre machado, mais atual, e cada vez mais machadiano.
Voltarei com um post sobre Memórias Póstumas, em que Machado destrona a realidade como experiência vivida, e postula uma realidade ampla, que associa experiência, sonho, imaginação e memória.

Até a próxima e sem essa conversa de que Machado é chato, porque chato mesmo é ser óbvio e superficial. Vai, vai, não desconversa, leia!

16 setembro 2008

Somente uma sogra pra passar por isso

Uma maritaca não pode lutar contra sua própria condição de animal. Quer voar, não pode, está na gaiola. Quer cantar, não pode, a casa não permite. Deixam-na, sob uma condição: em horários regulares, quando todos estão fora, ou quando vem visita. Escrava? Não, nunca, ela é preguiçosa. Em seu canto tem paz, comida e silêncio (todos trabalham muito).

Costume. Ficava deitada, asas encolhidas, quieta, aproveitando a ausência completa de ruídos. Um prazer inconsciente, espontâneo. Um bicho, mas um bicho e tanto.

Todos acordavam cedo. Como sempre a maritaca estava deitada, ninguém se preocupava, era comum vê-la dormindo. Entretanto, acharam-na excessivamente cabisbaixa. Com os dedos, a mãe acariciou a bichinha... e nada. Preocupada, chamou a irmã, dona e metida a cuidar de animais.

Ainda do quintal, gritou pedindo para esperar, pegaria, antes, os seus utensílios para tratar a sua prendada ave. Depois de alguns minutos, entra Aparecida, armada com comprimidos, termômetro, estetoscópio, gases, esparadrapo, e muito bom humor e pose.
Filme de terror desqualificado que se torna comédia trash de sábado à noite.

A gaiola estava num canto da área. Cida chegou com cuidado, chamando a bichinha (como todos a adoravam, nem nome tinha). Sem resposta. Objetiva, e nunca passional, levantou a asa dela e mediu a temperatura com o termômetro. Passados os minutos necessários, olhou a medida, franziu a testa, coçou a cabeça e concluiu: temperatura alta. Preciso baixá-la. Buscou na caixa-tem-tudo uma solução: pronto, perfeito. Um comprimido branco. Retirou a maritaca da gaiola, sem muito cuidado, apressada, abriu-lhe a boca e tentou depositar o remédio. Relutando, a ave travava a garganta para evitar ser sufocada. Sem êxito na empreitada, Cida apertou-lhe o pescoço e empurrou à força o comprimido quase até o estômago da bichinha. Ufa, foi difícil, mas salvei minha predileta.

No dia seguinte, logo cedo, a Mãe, por curiosidade, foi checar a maritaca. A bichinha estava dura feito pedra, um espantalho de ave.

Dá-lhe paracetamol, eita genérico bom!

09 setembro 2008

Escolha a mentira verdadeira

As listras do travesseiro
eram sua companhia
Azuis, brancas
Ofuscantes às vezes
Ouvi-las dizer...
Mas, agora, tempos depois,
tarefa complexa essa tal
de lembrança
Disseram de novo
Baixinho
Palavras vazias
Inexpressivas
inauditas
"Feche os olhos! Esqueça!
A memória é a personificação
da loucura!"
Lembrar é uma farsa
(Que abuso)
Criamos quando necessário
Mentir é rotina
Rimos da verdade
Juntos, em uníssono
"Você não existe"
Sangue quente
Imaginação fértil
Dormirei
Vou-me embora
pra escolha.

Um as Im a ge ns

Dormir é paz
Este sorriso
(gargalhada)
Uns tiros
O ventilador
A luz
A respiração
A vacina
E o gato?
Cocei a cabeça
Polícia
Todos dormindo
Alguém, lá, entra
Amanhã,
ao acordar
Tudo será
uma só procissão
de imagens sensitivas
despedaçadas
in
ca
paz
e
s
.

3ª parte - Falei, falar, não.

Virei as costas
Ela sumiu
Indiferente poderia
Quando, que tempo
insistente
Negra, pele ou olhos
Ruiva corpos odores
Tudo todas aquilo
aquela aqueles
Imagem forma desenho
pefil fôrma
Dentro, a estaca
Além, o instante
era
foi
seria
deixou
se...
não.

2ª parte - Falei, não falei

Falei
ela é negra
Dois dias e mais nada
Chorei, adolescente
Rodas de samba
Cerveja
churrasco
Óculos, livros, político, Tom
João
Ando sem espaço
Livre dos outros
Preso a mim
O espelho da consciência
me carrega
A pinga, só ela
meus olhos mê vêem
Meu pai não me atende...

1ª parte - Falar, não falar

Falar
não falar
falar
não, falar

Não falei
Os olhos são negros
Nunca mais a vi
Depois ganhei roupas
Estou no carro
Cético
Objetivo
Aspirina e Café
Uísque à noite
Sono de sonhos
(elas se contorcem
E eu, sorrio)
- É, preciso agora
de um remédio
mais forte
Onde estão meus pais?
Um tempo ausente
o relógio andou, está aqui do lado
voltou

06 setembro 2008

A dança do acasalamento EM SI.

O sexo é uma coisa estranha
A gente acha que são dois
Mais parece que é um por si
e outro só,

outro só
e um por si
(vice-versa
e versa-si)

Vem o malandro e reclama:

"É se é mais de dois?"

Até parece que´le pensàlem
de si...

Se são dois, três ou trezentos,
faz diferença nada,
na hora de ver, beijar e gozar (sofrer)
Dois é que se encontram
e de novo vão eles:

é um por si
e outro só
(versa-e-si
e outro lá)

O tema é desilusão
porque moral vocês conjugam
e lá, quando as paredes é que olham,
Não tem sexo, não tem nada

é um por si mesmo
e só

(sem respirar e ver)

Um morto, outro vivo,
um morto, outro vivo...

08 agosto 2008

Implícito

A maneira e o lugar comum
O princípio do precipício
Aberto
Ilícito
Incerto
Implícito...
No pedaço de espaço
O chamado
O amor
A doçura desse pensamento
Incendeia
E eu já não quero o teu amor
Eu já não sei querer
Mas há ainda o que me alivia
Há a imagem, a paisagem, a sintonia
Há a vontade, a vaidade, a fantasia
E se nada mais houver meu bem
Guarde pra você
Nossa poesia.
Guarde pra você
O que poderia...

(autor desconhecido)

07 junho 2008

Vírgula-em-fim

Um rosto agora.
Um sorriso depois.
Uma tragéia bem vinda.
Um ponto final.

Um dia depois do outro.
O corpo se desfaz em nós.
Quero saber da menina.
Quero saber da senhora.
Quero saber de sua prima
Quero saber de sua antiga.
Quero saber do seu depois.
Queria muito.
Queria no entanto.
Queria embora.
Queria pra tudo.
Querer é fazer.
Querer nunca foi poder.
Querer o teu rosto.
É uma pausa eterna.
E as pausas só no inferno.
Na vida tudo se vai.
E um dia a gente fica.
E uma vírgula por fim,

Não

Hoje foi um dia.
Amanhã seria outro,
não fosse a presença
de ontem.
Hoje, ontem, amanhã:
três tempos sem definição
quando se pensa em um
ou outro partiu.
Estar com eles?
nunca.
Resta saudade]
é nela que os cacos se juntam
e uma imagem em frangalhos se forma.

11 abril 2008

Terror

Engoli meu coração
e ainda foi sem respirar.
Ainda pulsando
pude senti-lo pensar.
Mas como?
Lógica e sentimentos?
Então, discutimos,
E o coração tomou a palavra:

- Sinto o azedume do estômago
Tenha a pele rompida
As artérias fechadas
Meu sangue agora é nostalgia
Penso porque me contorço.
Não me deixe pensar no escuro
do silêncio
Voz antes sonora, grave
Agora metálica, no fim.
Fujo de mim para não vê-lo
Ligeiro, vago para onde

Longe
Escondido em tua impressão
Está quase a minha presença
Mas estar para não perpetuar
É um não-ser absoluto.
Um morto no seio do corpo aquecido
Um paradoxo camoniano
Aqui arde, ali eu vejo
E quero mais
Durmo para que minhas impurezas
Se diluam até tomar forma de idéia
E partir para a inexistência do sentir
O coração em disse
E eu continuo...

Lugar plástico

Praia. Onde posso estar sem precisar olhar para os lados, inquieto. A brisa que emana de ti acaricia-me, adula-me, consola-me, faz-me ser. Entre o céu, o solo, a água e o vento, espero para morrer em paz, porque lá, naquele fim onde tudo se encontra, no horizonte, estamos nós dois.

Entre a areia e aquele derradeiro instante, temos um espaço, grande, por vezes perverso, desconsolador, intragável, aterrador... intestinos a esses vagos dissabores, está NOSSA existência, o aroma cego, a despalavra, a cintilância dos escuros, como dira Manoel de Barros. Inconstância humana, como os olhos de ressaca de todas as capitus e bentinhos.

22 janeiro 2008

Ficar

Tenho um vício: sentar-me à varanda.
Ficar, ficar, ficar...
Não sei o que vejo.
Nem penso o que sinto.
Sei que fico, fico, fico...

Tenho medo de morrer ficando...

Quando sou, lembro, e quando lembro, penso.
Sei que sinto porque penso que sinto.
E assim deixo de ficar.
Só sinto ao me deparar com a vontade imensa
de retornar àquele instante
que não é lugar
não é matéria, não é espaço
é um tempo sem toque
um vestígio de encanto
é o sopro suave da melodia que percorre o ar
sem seu amparo.
Para o impulso
existe apenas a motivação de sua presença.
Não é seca nem amarga a tensão que nos impele a fazer
(não a pensar).
Não é nada
Porque dizer é tentar saber.
Saber não se sabe
Sentir é sentir.
E ficar é sentir sem precisar pensar em sentir.
Ficar deve ser amar, pois.